MORTES NO TRÂNSITO ISTO TEM DE ACABAR! TRÊS VARIAÇÕES MALDITAS E IMPUBLICÁVEIS NA IMPRENSA COMERCIAL SOBRE O MESMO TEMA

MORTES NO TRÂNSITO: ISTO TEM DE ACABAR – TRÊS ARTIGOS IMPUBLICÁVEIS NA IMPRENSA MERCANTIL E SÓ POSSÍVEIS AQUI NA LIBERDADE DA INTERNET – TRÊS VARIAÇÕES MALDITAS SOBRE O MESMO TEMA OU A ORIGEM DO CRIME DE GENOCÍDIO NO TRÂNSITO QUE VIVEMOS NO NOSSO DIA A DIA…

(EM MEMÓRIA AO MEU QUERIDO IRMÃO MÉDICO DR. CARLOS ALBERTO PEREIRA DE BORJA MORTO NO TRÂNSITO EM 07.09.1984 NO RIO DE JANEIRO COM 33 ANOS DE IDADE).

TRÂNSITO, VELOCÍMETRO & DOSAGEM SOCIEDADE ANÔNIMA.

Esta é a sociedade comercial que melhor se coaduna para expressar, sob o manto de sua denominação, a cadeia de comprometimentos espúrios que desemboca nos delitos do trânsito turbinados pelo combustível etílico, o trago.
O velocímetro dos automotores, aquele que agora pode fazer o sol nascer quadrado, sinuoso como o astro rei é redondo ou tem o formato mediano de um por de sol. Sua escala que mede a velocidade, como um Deus ex-machina, potencializa e modula o livre arbítrio do usuário. Deveria se adaptar a lei, em matéria de potência e velocidade, no entanto, sempre e sempre ultrapassando os limites legais, possibilita, autorizado pelo Estado, a venda de automotores super-dimensionados. Nunca vi, ainda, velocímetros que marquem 400. Mas sei de modelos que vão de 220 até estratosféricos 300Km por hora. Ora, pegando como exemplo a marca de 220, o modelo é vendido com uma sobra de 120 km por hora. Isto é dizer que mais de 50% do que é vendido não pode ser utilizado. Pelo princípio da boa fé, cláusula geral estabelecida no Código Civil e pelo Código do Consumidor, está havendo um enriquecimento sem causa dos fornecedores. Ora os fornecedores, são autorizados pelo Estado Nacional, que inclusive taxa a produção com uma alíquota que ultrapassa 60% do bem produzido, sendo que as suas subdivisões tributárias, os estados (províncias) abocanham mais o ICMS e o IPVA, este diretamente proporcional à potência do motor. Assim é que temos um nexo de causalidade em que participa quem autoriza, o Estado e a cadeia que lhe segue: o fabricante, o comerciante, o anunciante, o propagandista, etc… Aí, o usuário, ou autor material do delito, é o último na cadeia de ação. Se for analisado sob o aspecto criminológico vamos constatar que estatisticamente os delitos de trânsito sempre, em maior número irão ocorrer acima da velocidade permitida e na faixa de velocidade super-dimensionada. Assim, sob a cadeia inelutável do nexo causal, quem possibilita o crime e fornece os meios, dolosa ou culposamente, pode ser enquadrado na cláusula de concurso.
Do trago. Na casa de meu avô, lá no Alegrete, no tempo bem antigo, conheci uns copos, que traziam as expressões: For ladyes, for men, for pigs. Hoje estes copos estão em desuso por serem caretas, ou “kitsch”. São uma antiguidade tão “por fora” como os pingüins de geladeira ou anões de jardim. A memória daqueles copos é o resquício de uma sociedade que estigmatizava o uso abusivo do álcool, ministrando, objetivamente o uso social do mesmo.
Hoje não há limite. Há uma cultura em que os super-heróis da velocidade e do paradigma do vencer na vida são na verdade os velhos pigs, travestidos em heróis da velocidade e do excesso em tudo. É a cultura dos Fittipaldi, dos Ayrton Sena´s e dos Barichellos da vida. O símbolo de suas vitórias, não é o louro dos gregos ou romanos, é uma ejaculação viril e preciosa da mais pura Champagne. Nelas se banham numa euforia de deuses adorados pelas suas belas Galisteus. Como Bacos e Dionísios hodiernos bebem diretamente no bocal, não de litros, mas de super-dimensionadas mamadeiras de sonhos. Eis o arquétipo social, aquele divisado por Yung em seu O Homem e seus Símbolos e Aldos Huxley na sua Ilha, que fundamenta as alavancas psico-sociais de reforço ao genocídio do trânsito que temos vivido. Aí identificamos não só o Estado Nacional, como seu maior acionista, em matéria de permissão, autorização e lucro na forma de taxação, mas também os seus sócios acionários, todos anônimos, numa cadeia de comprometimento inelutável e inescusável. Sozinhos, como cidadãos e contribuintes, vítimas da sua ganância temos que lutar para fazer luz neste mundo e fazer vencer a verdadeira democracia, dizendo juntos: ISTO TEM QUE ACABAR!!!!

A POLÍTICA DE TRÂNSITO E A HIPOCRISIA ESTATAL E SOCIAL

Despertou imensa polêmica jurídica, sociológica e médica a proposta do Ministro da Justiça, Tarso Genro, no sentido do confisco do veículo automotor do motorista reincidente em acidentes com morte. A indignação não é só do Ministro, mas também da Sociedade Civil, estupefatos com o incremento dos índices estatísticos do número de acidentes, mortos e feridos, no cotejo dos índices dos anos 2007 frente 2006.
No entanto é de se lembrar não só ao Ministro Tarso Genro mas a nossa Sociedade Civil, nas suas santas e benditas indignações, que este, entre outros é mais um dos graves casos da hipocrisia patológica que congraça o manto das dissimulações próprias da natureza humana. O espécime humano foi bem retratado pelo escritor Robert Louis Stevenson, quando publicou a novela intitulada “O Estranho Caso do Dr. Jekyll e de Mr. Hyde”. Ali o escritor esboçou, com ironia, a ambigüidade da natureza humana que oscila psicopatologicamente entre o bem e o mal num processo bipolar. Os pólos desta mesma natureza humana se complementam e criam a imensa teia da ilusão humana que se retrata na expressão popular: “Me engana que eu gosto!” Explico: O remédio preconizado pelo Ministro é um mero placebo. É aquilo que atende a indignação da alma e da consciência, mas não cura. Sugere mas é mero paliativo que atua somente a nível psicológico. Ao nível de realidade o fato continua o mesmo: O Estado Nacional que o Sr. Ministro representa fatura em impostos mais ou menos 60% sobre os automotores fabricados. Os motores fabricados são super-dimensionados frente às exigências legais, ecológicas, energéticas e logísticas. Com relação às exigências legais, pelo Estatuto do Consumidor, Lei 8078/1990, no seu art.4º e seguintes, não poderia o governo permitir ou autorizar a produção de motores que ultrapassem as velocidades permitidas no Código de Trânsito. O governo permitindo estimula os delitos praticados ao mesmo tempo que fatura e permite as companhias faturar sobre uma qualidade do produto que é proibida de ser usada; ecologicamente, um motor super-dimensionado, da mesma forma super-dimensiona a poluição contrariando o Protocolo de Kyoto, tão em voga mas sempre tão desrespeitado por todos; energeticamente o super-dimensionamento agrava o desperdício de energia num planeta que atingiu seus limites e, finalmente, logisticamente, o estado não consegue suprir a infra-estrutura de estradas e ruas, necessárias para preencher o consumo do deslocamento individual privilegiado frente as alternativas coletivas socialmente corretas, como metrô ou transporte coletivo.
Ora, ora, Sr. Ministro e Respeitável Sociedade Civil!! Abordar este assunto, pelo viés da verdade e não utópico, no ano do estouro dos recordes de venda da indústria automotiva, dos bancos que faturam com o financiamento, das seguradoras que seguram motores com potências virtuais perante a lei, do faturamento tributário do Estado sobre tudo isto é por demais irônico. Esta é a diferença exata porque o pregador do sonho e da utopia é Ministro, e eu, mero servo da verdade um articulista. Assim , com a esperança quase morta de ver este artigo publicado, não passarei toda vida de ser um mero articulista.

TRÂNSITO: UMA ABORDAGEM EPIDÉRMICA

O mote abordado na campanha do trânsito “isto tem de ter fim” é correto, no entanto, sua abordagem é epidérmica. Situa-se a flor da pele onde medra a dor, como efeito, não atingindo as camadas mais profundas onde remanescem, intactas, as causas da patologia. O grande dramaturgo norueguês, Ibsen, quando escreveu a peça teatral “O Inimigo do Povo”, abordou em imagem única e inesquecível a forma sócio-patológica que assume a hipocrisia humana na defesa dos seus interesses escusos.
No caso do trânsito suprime-se do raciocínio de identificação do problema uma ferramenta inerente à razão jurídica: o nexo de causalidade do crime. Assim é que o destinatário último, o cidadão, é que mais uma vez vai arcar integralmente com a desídia inicial do verdadeiro criminoso, o Estado Nacional.
O Estado Nacional autoriza a fabricação de veículos com motores que potencialmente ultrapassam a capacidade permitida de velocidade e de uso. Estimula, assim, concomitantemente, o abuso de velocidade e seus efeitos, através do uso de motores super-dimensionados legalmente e anti-ecológicos no seu mais amplo espectro, através da venda de produtos, que pelo Código de Defesa do Consumidor, seriam, s.m.j., inapropriados para o uso. O mais grave nisto é que o Estado Nacional, na forma federativa, através da União, recolhe imposto que incide sobre a fabricação, IPI, em mais de 60% sobre cada unidade vendida. Os Estados, recolhem IPVA sobre uma taxa de potência que não poderia ser comercializada, sendo que os municípios, não participando do bolo, vendem, ou melhor, arrecadam, através de uma farra de multas, coibindo o cidadão, por aquilo que não é proibido pelos demais.
O álcool, da mesma maneira, nas suas diversas formas de produção, destilados e fermentados, é autorizado e fiscalizado pelo Estado Nacional, sendo que a União lucra, com a tributação, sem colocar um tostão, mais ou menos 80% sobre a produção. Os Estados recolhem ICMS e os Municípios, arrecadam ainda sobre os Alvarás dos Estabelecimentos Comerciais.
Na seqüência do “nexo necessário de causalidade” se alinham, antes do consumidor final, uma fieira de intermediários tais como fabricantes, transportadores, propagandistas, anunciantes, comerciantes e inclusive seguradores, todos eles participando de uma cadeia bilionária de lucros e dividendos.
No entanto, aqui, com inversão total da lógica, o último elo estabelecido pelo “nexo indeclinável de causalidade”, o consumidor e cidadão brasileiro, é o responsável total pela guerra no trânsito. É a inversão total da lógica jurídica, pois no caso do tráfico de tóxicos, as penas mais graves cabem ao traficante e não ao consumidor. Combater os efeitos, participando nos lucros da causa motora de todo o processo, é uma agravante maior no dolo inicial. Muito mais grave do que a forma culposa que aflora como acidente e que também “tem que ter fim.”